sábado, 6 de fevereiro de 2016

vou te chamar de novo
preciso me acalmar
quero palavras suas
fala,
me conta o que é

há também a necessidade de deixar fluir
mas sem ver nada do caminho, como?

ao menos, se houvesse uma luz de lua
- quase cheia - começa escuro mas o olho acostuma
e vê detalhes que o sol esconde

seja lua
seja lua agora
reflita luz
me ilumina

você se ilumina pra poder me ver
só posso te ver se te iluminas
me clareio também
vamos deixar tudo claro?

o que quero?
claro é que pode não ser

então, tranquilidade
vamos ver

Em algum lugar de 2008

Estou tão à beira do abismo, o abismo tão à beira de mim, que é impossível cair.
É o fim.

Ele é o abismo. É tenso e solto, imprevisível.
Eu sou o vazio, oco. Intangível.

Vigiamos uma mesma coisa: o que há entre.
Entre o abismo e o vazio.
O impulso.
Fuja, por favor.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Plaft (Incompleto/2007)

Plaft. É o ultimato: ou você levanta agora dessa cama ou desiste do dia, já passaram seus 15 minutos a mais... vamo, acorda! Pronto!

É assim todo dia, o despertador toca, 15 minutos, jornal batendo na parede, plaft, eu preciso levantar, a cama, o edredon, o travesseiro, os travesseiros... depois o chão, o chinelo, o roupão. E lá vou eu, enquanto maldigo qualquer coisa, pegar o jornal. O cheiro de café denuncia que papai, muito provavelmente, já tá na sua cadeira, esperando pra abrir o Caderno 2.

Depois que mamãe resolveu ser monge, papai veio morar comigo. Então fizemos um acordo: ele prepara o café, eu pego o jornal. Assim, ele não deixa de esperar alguma coisa, e eu sou obrigado a levantar, só pra não deixar meu velho sem as notícias.... Tem dado certo.

O dia estava lindo! Por acaso olhei a placa da rua e fiquei confusa. Rua YN-15? Peraí, moro aqui há 25 anos... Na etiqueta do jornal, Rua dos Colibris, correto, corretíssimo. Entro em casa.
- Bom dia papai.
- Bom dia.
- Olha a nova da mulecagem, tão dando pra trocar as placas da rua.
Ele deu uma risada, pegou o jornal e me serviu o café preto, forte, sem açúcar:
- Essa garotada...
- Como sempre, passando dos limites. Tomei um susto, tá lá, Rua YN-15!
E ele já tinha aberto o jornal, mas prestava alguma atenção no que eu falava. Biquei o café, ops, quente.
- E isso lá é nome de rua! Se esse fosse o nome da nossa rua eu até pagava esses muleque pra trocar a placa... Vai ver foi isso, é, foi isso: alguém pagou.

Ás vezes os comentários de papai me preocupam. Ele anda muito poético, parece que vive no mundo da lua, também, não larga aquele segundo caderno... lançamento de livro pra cá, um filme excelente, uma abordagem ... isso tudo logo pela manhã.

- Acho que vou ligar pra polícia.
- Eu me lembro de quando a gente construiu essa casa... foi a segunda da rua, a primeira é a da frente, do Lorival. E a rua ainda não tinha nome não!

Semanas corridas de muito sol (Incompleto/2007)

semanas corridas de muito sol, e que a repetição reforce a idéia: sol, sol, sol. até de noite tinha sol, sem luz, mas calor de sol.
e na sexta, às seis, choveu. repetição: choveu, choveu, choveu.

ele não imaginava como era sua casa, ele não imaginava, ele não tinha casa.
vivia numa inconfortante, conformada, solidão: de si, do mundo, das coisas. como um tatu, um tatu metropolitano e sujo, morando embaixo da maior cidade do brasil.
morava ou se abrigava, ou se sujava mais ainda?

não que fosse miserável seu espírito, mas a vida toda de misérias materiais, sociais e afetivas o fizeram assim. um tatu metropolitano.

quando pequeno morava com a mãe num barraco. aos 14 anos fugiu.
por muito tempo morou entre papelões embaixo da ponte.

até aí, nada demais. essa miséria é normal aos nossos olhos anestesiados.

Vamos lá! (2007)

Vamos lá, começar,
pensar pra escrever, escrever pra pensar.

Lembrar pra escrever, escrever pra entender, entender pra organizar,
organizar pra agir, agir pra realizar, realizar por realizar,
realizar pra lembrar, lembrar pra escrever,
escrever pra lembrar!

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Um assunto não urgente

Hoje bateu a porta um senhor procurando por meu pai. Porque ele não estava, perguntei quem era e se queria deixar algum recado. Ele se apresentou e disse que não era nada urgente, nada demais, apenas passou em frente da casa e lembrou de bater, pois fazia tempo que não se encontravam.

Eu mantenho contato com meus amigos frequentemente - por telefone, email, redes sociais. Mas não lembro a última vez que bati a porta de um amigo pra conversar, ainda mais sendo um assunto não urgente. Talvez na adolescência tenha aparecido de surpresa na casa de alguma amiga, mas imagino que foi aos prantos por ter levado um fora, ou eufórica porque fui pedida em namoro - assunto urgentíssimo, portanto.

O fato é que fiquei pensando na riqueza que existe nos assuntos que não são urgentes. Naquela conversa despretensiosa que primeiro quer saber como anda a vida e depois vai se estendendo, estendendo - ainda mais se acompanhada de alguma coisa alcoólica. Quantas idéias, quantas músicas, quantos projetos, quantos laços já devem ter surgido dessas conversas. E podem estar surgindo agora.. tomara.

Nunca tinha visto esse amigo do meu pai.
Na próxima vez que ele bater a porta, vou querer conversar sobre os assuntos não urgentes também.

terça-feira, 19 de agosto de 2014


esse pensamento longe que tens..

longe que avoa
cabeça de vento
tão longe

alcança-me

tua imagem é uma afronta
tão perto

que desaparece

e já não sei se és pensamento,
imagem,
o próprio vento,

ou se és - eu